domingo, 14 de abril de 2013

Médicos e saúde pública


Médicos e saúde pública
(até final da monarquia)
Introdução
As câmaras de Alhos Vedros e da Moita sentiram desde sempre sérias dificuldades em fixar médicos na área dos respectivos concelhos. Tanto pelas vilas não oferecerem condições dignas para habitação dos clínicos, como pelos ordenados oferecidos, como ainda pela reduzida clientela.
Apenas na segunda metade do século XIX a informação se torna mais esclarecedora. Vejamos, relativamente ao assunto, alguns exemplos.

Médicos na Moita
O partido de médico na vila da Moita foi criado por provisão régia de 17/8/1799, depois de uma súplica do concelho de Alhos Vedros em que se queixava do facto do médico do partido do seu concelho assistir os doentes do concelho da Moita, pelo que “não era justo um concelho suportar as despesas de outro concelho”.
A 6/12/1800 foi admitido como médico o José Joaquim de Oliveira Semedo, mas logo no ano seguinte a sua nomeação foi posta em dúvida. A situação é caricata, tendo sido referida por Oliveira Martins na sua História de Portugal, de forma jocosa, pelo que transcrevo do auto respectivo a parte relativa ao assunto.
Auto de Vereação de 14 de Março de 1801.
E propôs na mesma Vereação o Vereador segundo Manoel de Jesus Ribeiro que havia requerido a presente Vereação para despacho das partes, e a bem da Fazenda Real, que no dia seis de Dezembro, próximo passado apareceu em Vereação daquele dia José Joaquim de Oliveira Semedo, requerendo que por ser Médico pretendia o partido desta Vila mostrando uma Carta a qual foi lida, em língua latina pelo Doutor Juiz de Fora que depois disse ele e mais Vereadores que aquele pergaminho eram Cartas de Formatura em Medicina, e por essa razão o dito Vereador segundo, e os mais Vereadores aceitaram, e assignaram a eleição que eles mesmos fizeram, do dito José Joaquim de Oliveira Semedo, para Médico do partido desta Vila na fé de que era Médico, porem depois se espalhou a notícia de que o dito José Joaquim de Oliveira Semedo não era Médico, e que as Cartas que tinha mostrado em acto de Câmara eram supostas, conforme ele Vereador Segundo tinha ouvido, e por essa razão fazia a presente proposição e pretendia, fosse chamado o dito Médico para vir a esta Câmara com as Cartas de Formatura a fim de serem vistas, e ficar ele Vereador desenganado, e livre de suspeitas, e dúvidas, por que no caso de ser Médico legitimamente se lhe continuasse o partido, e a não ser fosse suspenso do mesmo partido.
E logo votou o Procurador actual deste Concelho, que não tinha necessidade de ver outra vez as Cartas deste Médico José Joaquim de Oliveira Semedo, pois já as tinha lido o Doutor Juiz de Fora Presidente desta Câmara no acto de Câmara, em que foi ouvido.
E votou o terceiro Vereador Manuel Victor de Almeida e Costa que visto a proposição do Vereador segundo Manuel de Jesus Ribeiro, protestava, não ser responsável em tempo algum por sua pessoa, e bens, para a satisfação do partido do dito Médico enquanto se não verificar a certeza de o ser.
E votou o Vereador mais velho Domingos António Nunes, que as Cartas que o dito Médico apresentou em o acto de Câmara, em que se lhe conferiu o partido de Médico, foram lidas pelo Doutor Juiz de Fora Presidente desta Câmara, e que não tinha dúvidas nelas; E que a proposição do segundo Vereador, era por ser Cirurgião, e ter prejuízo, que haja Médico residente na Vila; E que o terceiro Vereador tinha assim votado porque era Boticário, por que não mandava para a sua botica as receitas todas.
E logo disse o Vereador segundo o Vereador segundo Manuel de Jesus Ribeiro, que à vista de todos do Vereador mais velho, e do Procurador, protestava não ser responsável por seus Bens a Real Fazenda do Cofre das Sisas donde sai o pagamento de alguns dos quarteis, antes de apresentar as Cartas originais de Formatura.
As suspeitas eram fundadas, de tal forma que a notícia ultrapassou os limites do concelho e o médico resolveu despedir-se e “isto da cidade de Évora para onde foi tratar dependências de sua casa”. A Câmara aceitou de imediato e decidiu mandar publicar na Gazeta que o partido estava vago.
Em junho de 1802 a Câmara pede ao rei que dê o lugar ao cirurgião António Borges de Lima enquanto não houvesse médico que residisse na vila. O problema volta de novo a provocar divergências, agravando alguns vereadores para o rei. Estas decisões reais não são referidas nos autos, todavia a morosidade destes processos acabavam por ser ultrapassadas pelas novas conjunturas. Contra a nomeação deste médico opôs-se Manuel de Jesus Ribeiro que é admitido, mas faleceu ainda nesse ano.
É admitido então Francisco de Sales Godinho, francês que se dizia cirurgião mas a sua nomeação era ilegal pois necessitava de confirmação régia e acaba também por ser demitido.
A 3/8/1803 é apresentado o Dr. António Firmo de Figueiredo Moreira a pedir o seu antigo partido de médico com o ordenado de 60 000 reis anuais enquanto não houvesse um médico formado que viesse residir na Moita. E como saíra logo que apareceu o Dr. Semedo que se dizia formado mas que se ausentou, devia por isso ser de novo admitido porque a Câmara nunca procedeu legalmente contra ele pois nunca faltou às condições do seu termo. A Câmara aceitou na condição deste sair logo que houvesse médico formado e nas condições a que se tinha sujeitado em 14/3/1796, a saber; vir duas vezes por semana curar os enfermos, aos pobres de graça e aos outros não pedir mais de 60 reis por visita e vir todas as vezes que fosse chamado e houvesse necessidade. Faltando a estas condições e havendo duas testemunhas podia ser despedido, não sendo por doença ou urgente necessidade. A decisão não foi pacífica, tendo os vereadores agravado para o Supremo Tribunal tanto contra a admissão do médico como contra o Juiz de Fora por este ter decidido a sua admissão e mandado pagar os seus honorários o que na opinião dos vereadores só podia ser executado por despacho da Câmara.
Em 1807, o partido de médico é conferido ao bacharel José Ferreira Cidade, morador no Lavradio. No ano seguinte o bacharel João Batista Antunes pede para ser nomeado para o partido médico, porque o actual servia interinamente e enquanto não aparecesse outro que se obrigasse a residir na vila. Este pedido é aceite, devido à necessidade de um médico residente na vila e o anterior é despedido pela impossibilidade que tinha em assistir aos enfermos visto morar no Barreiro e nela ter o partido de médico. O médico João Antunes fica obrigado a residir na vila, a curar de graça os pobres, a cobrar pelas visitas 120 reis na vila e 300 reis no termo e o ordenado era de 140 000 reis. Ainda neste ano é despedido por se ter ausentado sem dar conhecimento nem ter autorização da Câmara.
Em 1810 este médico volta a requerer o dito partido, é aceite nas mesmas condições de 1808, mas vai requerer ao rei que lhe aumente o ordenado, que é pago pelo cofre das sisas, pois é a causa do pouco interesse em servi-lo
A relação dos médicos com a Moita pode ser resumida pela justificação que deu para aceitar o cargo, “só aceita o cargo por ter na Moita pessoas da sua familiaridade e ficar perto da corte, onde tem a família”, mas na esperança de um aumento que satisfaça a sua subsistência física, de um criado e de uma ama. Afirma que 140 000 reis chegam apenas para manter uma cavalgadura, absolutamente necessária a um médico para o desempenho do seu ofício. Recorre por isso à benignidade do rei para lhe conferir um partido de 300 000 reis pagos pela mesma maneira, para fazer face a outras despesas com casas e rebate de papel-moeda (estávamos em pleno período de invasões francesas) e porque o médico deve tratar-se com decência e gravidade. A resposta é favorável ao requerimento apresentado, considerando não serem excessivos os 300 000 reis, não só pelas razões apontadas como ainda porque as circunstâncias e a saúde pública exige ainda mais que em outro tempo a assistência de um médico, pois a guerra e a invasão do inimigo tem feito sofrer na corte e mais povoações quase uma epidemia, sendo certo que irá haver falta de médicos, não só pelos que têm ido para a América como por ter fechado a universidade de Coimbra. Quer dizer que não era lugar apetecível para a classe. Esta situação vai ser recorrente ao longo do século com uma ou duas excepções.
Em 1873 Silva Evaristo aposentou-se. Aberto novo concurso é admitido Joaquim Nascimento Trindade de 28 anos, porque “mais pode satisfazer ao exercício clínico da área da freguesia cuja maior parte precisa ser percorrida a cavalo”, em detrimento de outro concorrente porque “já é septuagenário”.
A 6/8/1874 é admitido como médico na vila da Moita, Alexandre Gomes Carvalho Ferreira. Toma posse a 1/4/1875, (meio ano depois), em 6/8, demite-se.
Abre-se concurso para novo médico e a 2/10 toma posse Joaquim Nascimento Trindade Rodrigues a 5/12 pede licença para se ausentar. Em janeiro de 1876 continua a faltar, justificando-se pelo facto da “mulher estar doente” e pede licença para se ausentar. Em maio pede exoneração do cargo, o que não é aceite, mas no mês seguinte volta a pedir licença para se ausentar.
A 21/6/1876 é admitido Jerónimo Gonçalves Ribas, a 4/8 toma posse e no mesmo dia pede licença para se ausentar. Aguentou dois anos pois em 1878 pede exoneração.
Em outubro a Câmara regista que “o médico recentemente nomeado pede desculpa por não se ter apresentado”, por várias razões, uma delas, “ter-lhe adoecido a esposa”.
Caso exemplar é o de Joaquim Silva Evaristo de Almeida, filho do médico Silva Evaristo, personalidade prestigiada no concelho, e natural da Moita. Apesar de ainda estudante do 5º ano, é aceite como médico, em virtude de não haver concorrentes, mas depois de aceite recusa tomar posse. No ano seguinte oferece a sua tese de licenciatura à Câmara, que muito se orgulha do acto pois “trata-se de um filho desta terra”.
João José Santos Graça é admitido em 1880 devido “a informações favoráveis e honrosas que a seu respeito pode colher”. Já que um dos vereadores preferia e votou noutro concorrente. No mesmo ano pede exoneração.
No mês seguinte é admitido Gregório Rafael da Silva de Almeida. Entretanto nos períodos em que não havia médico era solicitado o médico de Aldeia Galega.
Joaquim da Cruz Nogueira é admitido em 1885, “por algum tempo, …, no impedimento do efectivo” isto porque “grassando, …, as epidemias de sarampo e anginas diftéricas se prestou a combate-las com a maior energia, desvelo, desinteresse e inexcedível prontidão”.
Em 1886 é admitido João Cândido Cordeiro. Caso raro de permanência no lugar, apenas suplantado por Silva Evaristo. Demitiu-se em 1901 desiludido com a Câmara. Diz que aceitou “o cargo quando este estava desacreditado, não havendo ninguém que o quisesse ocupar. Sai por lhe fazerem exigências a que não se pode submeter e à falta de gratidão”.
Tanto João Cândido Cordeiro como Evaristo de Almeida ofereceram à Câmara as suas teses de licenciatura. Tive oportunidade de as ler quando estes documentos se encontravam na antiga biblioteca da Moita que funcionava num pré-fabricado. Recordo que se tratavam de trabalhos que hoje nos pareceriam coisa de alunos do liceu. Eram constituídos por cinco ou seis folhas e dissertavam sobre a temática que preocupava a ciência médica na época, ou seja, a higiene pessoal e pública como foco de doenças.
Câmara decide então que o médico de Alhos Vedros acumulasse os dois lugares, que aceita, mas solicita imediatamente outro médico “para o coadjuvar”.
A falta de médico ou a sua negligência não cumprido com o contratado que era a de não se ausentarem é constante. O exemplo registado nos autos da Câmara de 1903 é prova disso. Diz assim; “Câmara lamenta que no dia de entrudo fossem requisitados, pela autoridade administrativa, socorros a médicos diferentes, por ferimentos de que um deles resultou a morte, e não se encontrasse no concelho médico algum”.
Em abril é admitido José Boleirão Proença que no acto de posse que tem de se ausentar, mas deixa Alberto Guimarães a substitui-lo. Acabará por ser este médico na Moita pelo menos até 1910. Em dezembro de 1908 a Câmara faz-lhe um elogio, considerando-o “um clínico modelo”.
Nesta sucessão de médicos devemos considerar o Dr. Silva Evaristo um caso particular. Foi na Moita que fez a sua carreira, constituiu família e morreu. É nomeado médico em 1845 e foi titular do cargo até 1873. Neste ano aposentou-se e a acta da Câmara de 3 de Outubro elogiou a sua dedicação nos 28 anos de serviço. Nos anos seguintes de 1874 e 1875 volta a ser chamados várias vezes para desempenhar o cargo por falta dos efectivos, ou nos períodos em que este vagava. Faleceu a 19-10-1877, pelo que transcrevo o acento de óbito;
Aos dezanove dias do mês de Outubro, do ano de mil oitocentos setenta e sete, por oito e meia horas da noite, em sua casa, na Quinta de Ponte de Caia desta Freguesia da Moita do Riba Tejo, Concelho e Arcyprestado do mesmo nome, Diocese de Lisboa, faleceu sem ter recebido os sacramentos da Santa Madre Igreja, um indivíduo do sexo masculino, por nome José Joaquim da Silva Evaristo, cirurgião médico pela escola de Lisboa, e proprietário, de cinquenta e seis anos de idade, casado com Dona Isabel Maria de Almeida Evaristo, natural da vila de Alverca do Riba Tejo, desta Diocese, e paroquiano desta da Moita, filho legítimo de José Evaristo da Silva, e de Dona Jacinta Maurícia Gonçalves, falecidos, naturais da supra mencionada Vila e Freguesia de Alverca. O qual não fez testamento, deixou cinco filhos, e foi sepultado no cemitério público, digo, e foi depositado no jazigo do Ilustríssimo José Luís Correia, levantado no cemitério público desta Vila. E para constar, lavrei, em duplicado, este termo, que assino. Era ut supra

O Prior- Miguel de Pina Melo

Em 25 de Agosto de 1909 o Presidente da Câmara “como preito à memória de dois ilustres cidadãos; propõe que a rua de Palmela se passasse a denominar rua Dr. Silva Evaristo e a rua Direita, rua Teodoro da Costa Afonso, depois de obtida autorização dos familiares”. Filho de Silva Evaristo autorizou. Já o filho de Teodoro da Costa Afonso não autorizou “porque se fez benefícios ao Concelho, não fez mais que o seu dever”.

Médicos em Alhos Vedros
As nomeações de médicos para Alhos Vedros surgem desde o século XVII, altura em que temos documentação. Na Moita desde a criação do concelho. Todavia a informação é escassa e irregular.
Em 1667 fazem os moradores de Alhos Vedros uma petição, “em que pediam fosse despedido o médico João Rebelo”. Analisada a petição “o houveram por despedido do partido visto as queixas que havia dele e a este respeito se lhe não lançaram já este ano no cabeção das sisas os 60 000 reis que lhe davam”.
Apenas sete anos depois surge nova referência. A Câmara declara que “aceitaram por médico desta vila a Matias Enriques,…, médico moraria nesta vila para todos os dias assistir aos doentes, …, pagando-se-lhe suas visitas, …, pelo partido de 60 000 reis pagos em quatro quartéis. … e também será obrigado a acudir aos lugares deste termo quando for chamado pagando-se-lhe suas visitas na forma que no dito lugar for estilo.”
Nova referência surge em 1685, onze anos depois. É nomeado Domingos Ferreira, as condições são as mesmas, apenas diverge a linguagem, agora em vez de visitas fala-se em “curas e sangrias” e o ordenado aumenta para 100 000 reis. Esclarece que morando fora da vila perde o lugar.
Nestes séculos o médico podia recusar, (pedir escusa), para qualquer lugar ou função para que fosse nomeado. Aconteceu ao médico Diogo Mendes Castro, em 1690. Nomeado para recebedor das sisas, entende que “devia ser escuso, …, por ser muito achaquado e por essa causa não poder satisfazer sua obrigação como também por ser médico do partido desta vila e lhe ser preciso assistir aos doentes, …, e ser médico do partido do Lavradio, …, e por estar de presente desposado e recebido por procuração na província da Beira”.
Em Alhos Vedros a situação é pior, pois os médicos preferem a Moita, onde ganham mais e têm mais clientes, pois tem mais população. Sempre que vagava o lugar na Moita o médico de Alhos Vedros solicitava transferência.
Vejamos alguns casos; em janeiro de 1876 o médico em serviço pede exoneração. Aberto concurso apenas concorre um médico licenciado pela escola médica do Funchal, pelo que não podia ser “aceite”. Apenas eram admitidos médicos formados nas faculdades de medicina de Lisboa, Porto e Coimbra. Todavia acaba por ser admitido em maio, por não haver mais concorrentes. Apesar disso faltou ao acto de posse, o que sendo “avisado”, respondeu “que só podia tomar posse em novembro ou então renunciava”.
Não sei se chegou a tomar posse, mas em abril do ano seguinte não havia médico nem concorrente para o lugar.
Entretanto deveria ter sido admitido outro médico pois ainda em novembro desse ano a Câmara regista que o médico resignava e era admitido José Carmo Borges. Não chegou a aquecer o lugar pois em abril seguinte já não há médico nem concorrente ao lugar. É admitido em novembro José Maria Jacob, mas a história repete-se, em abril do ano seguinte nem médico nem concorrentes.
A falta de médico em Alhos Vedros levava a Câmara a tentar remediar a situação. Assim em 1879 é o médico da C.P. a pedir para “ir diariamente a Alhos Vedros visitar os enfermos”, o que não é aceite.
Além disso a Câmara encarrega o médico da Moita a ir a Alhos Vedros, “para não deixar aquele povo abandonado de recursos médicos” e porque “não onera o município,…, antes pelo contrário”. Poupavam nos vencimentos.
Entretanto outro médico terá sido admitido pois os “habitantes,…, pedem para serem visitados pelo médico da Moita” porque “actual é pouco assíduo nas suas obrigações”. É demitido e aberto novo concurso.
Esta situação é recorrente para todo o período em análise.
Outros casos; em agosto de 1883 toma posse o médico Porfírio de Miranda, em outubro pede exoneração por “não lhe servir continuar”.
Entretanto é admitido António Patrício de Miranda que deveria ter-se demitido pouco depois, já que no início do ano seguinte não há médico
Aberto concurso não há concorrentes. Artur Lima Carvalho é admitido provisoriamente e abre-se novo concurso. Em abril continua a não haver concorrentes, em dezembro a situação mantem-se e torna-se necessário abrir outro concurso pois tinha passado o prazo do concurso em vigor.
Só no ano seguinte de 1885 é admitido novo médico, mas solicita imediatamente licença para se ausentar “devido aos seus negócios em Lisboa”, o que é recusado. Então o médico pede exoneração do lugar. Quer dizer, não chegou a exercer o cargo.
Em 1895 é admitido outro médico, no mês seguinte pede licença para “se ir tratar nas termas”. Não deveria ter voltado pois no início do ano seguinte é nomeado outro médico. Só que, quando devia tomar posse informa que “ não aceitava o cargo”.
Caso insólito ocorreu em 1898 com o médico Teodorico Ildefonso Colaço. Registam as actas que o referido médico foi agredido por Francisco António Moreira e que “habitantes de Alhos Vedros apontam irregularidades ao médico”. Assiste-se então a um diferendo entre o médico e a população. Em face da discórdia a Câmara porque “duvida de algumas assinaturas, manda averiguar os factos”. Por sua vez o médico “pede certidão da acta referente às acusações contra ele e as pessoas que as fizeram”. Este diferendo é resolvido pela acta de 12 de dezembro onde a Câmara conclui que o “médico de Alhos Vedros, está dando lugar a contínuos clamores e conflitos, exige de doentes pobres e indigentes honorários por serviços que tem obrigação de atender gratuitamente negando-se a atender quem não pode pagar, chegando a rasgar as receitas já passadas para não serem aviadas; apresenta-se em casa dos doentes completamente embriagado, chamado muitas vezes em casos urgentes, não vai, o que obriga a recorrer a médicos de fora o que obriga os doentes a pagar 1500 e 2000 reis por visita.
Na contestação apresentada pelo médico algumas assinaturas foram extorquidas a doentes que estava tratando e exigidas sob ameaças, outras são completamente falsas por serem de indivíduos que não sabem ler nem escrever, outras são de indivíduos moradores no Barreiro. Inquirido sob estas acusações respondeu de forma inconveniente e ardilosa. Para impedir vindictas contra os que o acusaram e irregularidades e restabelecer a tranquilidade, decidem afastar do meio deles quem já não os pode servir”. Por unanimidade foi exonerado.
Os médicos só aceitam trabalhar em Alhos Vedros como última opção. Isso continua a verificar-se nos anos seguintes. Logo em fevereiro de 1899 é nomeado novo médico mas no acto de posse diz que “não aceita”. Em abril é nomeado António Anastácio Bettencourt, só que “não se apresentou para tomar posse”.
Faltando o médico em Alhos Vedros o cargo era assumido pelo médico da Moita. Neste caso o médico da Moita, em Maio de 1899, pede exoneração propondo para o substituir Manuel Fernandes da Costa Moura, que é aceite. Mas em Abril seguinte é este a pedir a sua exoneração e é aberto novo concurso.
No ano de 1900 é o médico João Gonçalves que “aceita apenas interinamente visto a epidemia de gripe que grassa no concelho”.
Alho Vedros tem a particularidade de existir uma misericórdia. Aqui, desde o século XVII, a Câmara de Alhos Vedros ao contratar os médicos estabelece uma cláusula onde obriga os médicos a curar “por amos de Deus”, os providos da misericórdia, cláusula desnecessária, pois sendo provido da misericórdia não tinha rendimentos e o médico só podia cobrar as consultas a quem tivesse rendimentos acima de determinada quantia. Referido nas actas da misericórdia é o caso insólito que passo a transcrever; “… lamentável caso de João Escumalha que regressava a casa e se disparou a espingarda que trazia ferindo-se no braço, esmagando-lhe e rompendo-lhe uma artéria, de que resultou forte hemorragia sendo socorrido pelo doutor João Cândido Cordeiro com urgência de que resultou a salvação do infeliz, decidiu a Mesa que fosse inserida na acta um acto de louvor agradecimento ao digno doutor João Cândido Cordeiro, pelo desvelo, carinho, prontidão e desinteresse, …, para salvar o infeliz”.
A misericórdia inicia, pelo menos desde 1894 a estipular no seu orçamento uma verba para medicamentos. Apesar disso esta era reduzida ou eliminada sempre que havia carências económicas ou financeiras.
A intervenção da misericórdia na saúde pública torna-se mais importante na vila depois da segunda década do século XX como descrevo no artigo: Assistência social na S. C. M. Alhos Vedros.
Guarda-mor da saúde
Nos séculos XVII e XVIII as câmaras nomeavam para todas as localidades do concelho, não só as vilas sede, os chamados Guarda-mor da saúde, que eram constituídos por um provedor, um escrivão e um meirinho. As actas referem apenas as nomeações, e o nome dos nomeados sendo omissas quanto às suas competências obrigações.

Funções do médico
Higiene pública
O final do século XIX foi particularmente agressivo em epidemias que vitimaram milhares de pessoas. Em Alhos Vedros é inclusivamente necessário, em 1898, alargar o cemitério “devido à epidemia de varíola que tem atacado a região”. O desenvolvimento da medicina estabelecia uma relação directa entre a propagação de certas doenças como a cólera, a malária ou a gripe com as condições higiénicas. Assim a Câmara sob proposta ou conselho do médico vai tomando decisões para combater a falta de higiene.
Porto da lama, (da merda)
Problema grave que afectou, desde o seu início, a vila da Moita, foi a instalação do porto da lama, ou seja da merda, pois era disso que efectivamente se tratava. Os dejectos de Lisboa eram transportados em barcos e despejados na Moita. Tratava-se de um negócio altamente lucrativo para o Presidente da Câmara de então, Antas Barbosa, que não vou desenvolver pois não se insere no âmbito deste trabalho.
Certo é que logo em 1880 é a própria Câmara que reconhecendo que “grassando há tempos nesta vila e especialmente no sítio do porto a epidemia de varíola que tem afectado crianças e adultos havendo já dois casos fatais, atribuía esta epidemia à montureira existente no porto” decide fazer regulamento para “evitar futuros males”.
Outra decisão ocorre em 1882 determinando “a proibição de desembarque e acumulação de estrumes no sítio da Orta, contígua à estrada do Rosário” devido aos perigos para a saúde pública.
Em julho 1883 a Câmara considera que “nesta quadra mais doentia do ano, e quando a cólera ameaça invadir a Europa, …, tomar precauções”. Entretanto ordena que se retirem o “mais breve possível” para fazer “desaparecer da vila qualquer foco de infecção”. Por isso a Câmara decide elaborar um regulamento “para obstar à demora de estrumes”. Médico fica incumbido de fazer a vistoria para “passada hora e meia donos intimados a retirar os adubos”.
As ditas lamas tornam-se um problema que a Câmara procura resolver sem sucesso. Ora determina que as lamas e lixos existentes no porto fossem “mudados para a fazenda do Clemente contígua ao Juncal” como determina ao encarregado da companhia dos descarregadores do porto “para que não permita o desembarque das lamas e outros quaisquer objectos na área no porto, sem que se dirija ao guarda da Câmara para este destinar, …, lugar onde devem ficar depositados”.
Também perigoso para a saúde pública é o facto de algumas pessoas, como foi o caso de dois filhos de Bernardo Tavares, andarem “na apanha de trapos vindos nas lamas da limpeza da cidade de Lisboa, …, que se costumavam desembarcar e depositar no porto”. Por isso esta prática foi proibida.
Apesar disso o negócio não parou. Por exemplo em 1885 a Câmara proíbe entre Julho e Outubro, “por disposições higiénicas e sanitárias” a “importação de lamas”. Imediatamente os barqueiros reclamam 60 000 reis correspondentes a 120 barcos que deviam carregar e assim ficam impossibilitados de o fazer. É fácil fazer as contas. Um barco de merda por dia, recebendo o dono do barco 500 reis por carga. Também os rendeiros do imposto do cais e porto “pede abatimento por, …, não haver desembarque de lamas no porto, …, se achava prejudicado em relação ao preço de arrematação”.
Percebe-se que a Câmara não conseguia resolver o problema e tomava medidas conjunturais. Repare-se nesta de 1900, em que proíbe “a descarga de lamas no porto, desde o muro da caldeira até ao lugar onde estão as lenhas. Só pode descarregar quando as águas forem de quebramento que impeçam os barcos de chegar mais acima, depois de obter licença do vereador do pelouro”.
No ano seguinte nova decisão. Diz que de Maio a Setembro é “proibido depositar lamas, estrume ou outros adubos no porto. Só pode descarregar para dentro das carretas”. Num auto posterior é também proibido “o desembarque de lamas para depósito” para “mais tarde não estorvar o desembarque por conta dos fazendeiros”.
Até 1910 foram tomadas diversas medidas para resolver ou minorar a situação. Apesar disso em 1909 a Câmara ainda reconhece que “lixo importado para agricultura empesta”.
Focos de infecção
Diferentes razões podem provocar focos de infecção, nomeadamente as águas estagnadas. É o que se verifica em diversos casos. Uma das situações descrita em 1884, diz que na estrada para o Barreiro “ao lado do aterro contígua à propriedade de Francisco Gomes de Jesus, havia uma porção de terreno onde se acumulavam águas por falta de um viaduto que lhes dê passagem podendo na próxima época calmosa resultar dali prejuízos para a saúde pública”. É decidido tomar as providências necessárias.
Em Alhos Vedros o Administrador do Concelho, em 1895, “solicita que mande pôr à disposição do delegado de saúde meia barrica de cloreto e meia de sulfato de cobre para desinfeção de valetas e outros lugares”.
Outra situação ocorre em 1906 quando o médico de Alhos Vedros contesta junto da Câmara, “condenando a forma como se está a construir uma fossa junto à estação da C.P.”.
Paços do concelho
Logo na década de oitenta o médico lembra “a conveniência de mandar caiar o pátio dos Paços do Concelho, e as cadeiras que se acham bastante porcas” por ser assunto de “salubridade pública”.
Escolas
Também nas escolas o médico “lembra a conveniência de serem lavadas repetidas vezes e desinfestadas as sentinas,…, limpar com grandes quantidades de água,…, semanalmente com desinfetante”.
Limpeza das ruas
A limpeza das ruas da vila passa a ser também uma preocupação. Em 1903 é determinado que os “varredores, …, tem ordem de varrer as valetas e limpar as imundícias do macadame, por determinação do subdelegado de saúde”. No mês seguinte “lembra a conveniência de se fazer a limpeza das ruas às duas horas da manhã e de se deitar cloreto de cal onde for preciso”. Em 1909 a Câmara determina que o “zelador não consinta montureiras dentro da vila, e olha-se com mais cuidado de forma como se faz a limpeza de ruas, cujo estado é deplorável”.
Pão
Também sobre o fabrico e venda de pão se tomem medidas de caracter sanitário. Assim foi aprovada uma postura municipal que decide que é proibido pôr à venda pão bolorento, pouco levedado, mal cozido ou fabricado com farinha que tenha mistura, prejudicial ou não à saúde. Determina ainda que é “proibido empregar no fabrico pessoa pouco asseada, ou que padeça moléstia contagiosa ou asquerosa”. O incumprimento é penalizado com 2 000 reis de multa. “Para se aplicarem estas multas, …, é necessário reconhecimento da entidade sanitária”.


Água
Também relativamente à salubridade da água para consumo das populações o médico intervém. Em 1883 o médico de Alhos Vedros apresenta um ofício onde solicita reparações no poço, para que a população tivesse acesso a água potável, demonstrando em que consistiam as reparações. A Câmara constatando que as ditas reparações orçavam em cerca de 100 000 reis decidiu que “não é possível para já”.
No ano seguinte de novo o médico sugere a “urgência em adquirir por qualquer meio o porte de uma fonte de excelente água sita em um caminho público e numas salinas pertencentes a Vicente Coelho de Miranda, …, água do poço, …, está transtornada”.
No ano seguinte a Câmara decide “melhorar poço de água potável de Alhos Vedros” mandando fazer “reparos” para “evitar que infiltrações alterem a água” pelo que manda “betumar fendas e calçar com preciso declive a área que o circunda”. Obviamente os reparos não resolveram nada.
Relativamente a este assunto passaram duas décadas até a Câmara voltar a preocupar-se quando solicita que o médico de Alhos Vedros “informe sobre doenças epidémicas e sobre a influência que tenha o consumo de água do poço”.
Já na Moita a situação de seca em 1906 obriga a tomar medidas, não só limpando o poço do concelho, chamado das bravas, como a tentar melhorar a mãe de água e a sua canalização ao chafariz. Medidas que não resolveram a situação pois a água continuava insalubre. A Direcção da C.P. Sul e Sueste, a pedido da Câmara, “autoriza os habitantes da Moita a utilizarem a água do poço da estação enquanto durar a presente estiagem, sujeito às horas em que a estação está aberta”. Câmara fica reconhecida.
Talhos
Nos talhos do concelho torna-se obrigatório “trazer balanças, pesos e cepo no maior estado de asseio”.
Matadouro e abate de animais
O matadouro deve ser limpo. A decisão da Câmara é clara neste aspecto quando em 1881 afirma que “ casas do paço e açougue se acham no maior estado de porcaria, …, intimados a conservar no maior grau de asseio”.
Também perigoso para a saúde pública é o abate de animais doentes, pelo que é decidido “não permitir (abate de reses e porcos), sem prévio exame do vereador, do médico e do regedor” Já no século XX, compete ao médico da área do matadouro “avaliar estado da carne” assim como do estado de limpeza do matadouro.

Peixe
A venda de peixe fica também sujeita a controlo sanitário. A partir de 1880 é decidido fazer um regulamento para esta actividade devido aos “abusos praticados pelos vendedores de peixe nos mercados públicos, …, denominados paços de venda, …, indo (o povo) abastecer-se, …, se encontravam em estado de putrefacção  …, outras vezes com preços acima do primeiro pregão”.
Iluminação pública
Relativamente à iluminação pública também se tomam medidas. Determina a Câmara que os candeeiros sejam limpos “por se considerar anti-higiénico e evitar desenvolvimento de febres”.
Amas
A miséria no concelho era endémica. A Câmara subsidiava amas-de-leite para criar crianças cujos pais não podiam ou não queriam fazer. A justificação mais comum era a de que se tratava de crianças órfãs ou abandonadas. Era vulgar também as mães não terem leite, os pais já terem muitos filhos ou por serem “extremamente miseráveis”.
A Câmara só efectua o pagamento às amas depois do médico inspeccionar as crianças e atestar ”estarem no melhor estado de saúde e tratamento”.
Sortes
Compete também ao médico assistir “às sortes” militares. Todos os anos, entre os mancebos sorteados para o serviço militar vários pediam “escusa”. Os motivos desse pedido de escusa, por vezes, requeriam a opinião do médico. Relacionavam-se sobretudo deficiências físicas e mentais, ou insuficiência física, “ser muito fraco”. As decisões destes exames médicos, por vezes, ficam registadas, mas numa frase que justifique o veredicto, como em 1879 em que um mancebo é escusado porque o médico “confirma gaguez e alguma coisa de surdo”. Já no ano seguinte, um outro mancebo que afirmava ser surdo, não teve a mesma sorte, porque o médico não confirmou.
Jazigos
Foco infeccioso era sem dúvida a falta de cuidado com os cadáveres. Por isso a Câmara decide que os jazigos da capela do cemitério fossem desinfectados com “cloreto de cal, sulfato de cobre e água de la barraqua” (?).
A partir de 1898 os donos dos jazigos ficam obrigados a limpá-los uma vez por mês.

Prevenção das doenças
Apesar das medidas atrás referidas visassem prevenir e combater as doenças e sua propagação outras de carácter mais específico foram tomadas. Vejamos; em 1899 é o Governo Civil que dá instruções “sobre a recepção, isolamento e tratamento de alguns doentes com moléstia suspeita”. Ainda nesse ano é a Câmara que decide transferir todas as verbas destinadas a obras que ainda não se tivessem iniciado para “despesas sanitárias”. Decide ainda “incluir no orçamento verba para fundo de beneficência contra a tuberculose”.
Ainda nesse ano informa que “no Instituto Bacteriológico de Lisboa pode ser requisitado soro anti-tetânico gratuitamente, aos munícipes e indigentes que o requisitem. Às farmácias pelo preço de 900 reis, assim como a vacina anti-pestosa que poderão vender pelo preço máximo de 1 000 Reis”.
Em 1900 é o Administrador do Concelho que requisita uma barrica com cloreto de cal para desinfeção de alguns locais.
No ano de 1901 é autorizada a compra de aparelhos de desinfeção, mas não especifica.
Em 1903 “o subdelegado de saúde, requisita desinfectantes e um pulverizador para combater doenças contagiosas, endémicas ou epidémicas e lembra a necessidade de prover os edifícios dos Paços do Concelho e das escolas primárias com escarradores para evitar que se lancem sobre o pavimento a expectoração.
Requisita também “frascos de vidro com capacidade de 1 litro para colher amostras para análise em Lisboa e caixas para enviar os frascos”. A Câmara não atende porque “não tem orçamento”.
Ainda neste ano torna-se obrigatória a vacina anti varíola.
A situação todavia não melhora e a Câmara decide em 1908 “que se dê desinfectantes aos povos de Alhos Vedros e da Moita”.
Já em 1910 é decidido “regular o funcionamento do serviço de desinfestação de habitações no concelho, de forma a que não seja a cargo da Câmara podendo os moradores pagar. Só será dada assistência aos reconhecidamente pobres”. E é decidido o seguinte preçário: 1 grama de sublimado 30 reis; 1 grama de formol 500 reis; 1 grama de enxofre 40 reis.
Neste ano de 1910 a Câmara ordena que o “subdelegado de saúde tome medidas enérgicas em relação à higiene na previsão da cólera”.

Instalações hospitalares
Em qualquer dos concelhos nunca houve instalações próprias para tratar ou internar doentes. Apesar de sabermos da existência de hospitais em Alhos Vedros desde o século XV, estes não tinham a função que hoje lhe atribuímos.
No final do século XIX as epidemias matavam sem olhar a sexo, idade ou classe social. A Câmara não podia ficar indiferente. As epidemias matavam e metiam medo. Por isso em 1883 decide “dispensar qualquer quantia para fundação e manutenção de hospitais para coléricos” como também “por em execução todos os esforços para prover de remédio e os mais prontos socorros”.
No ano seguinte é o próprio Administrador do Concelho que “oferece casa, …, próximo da vila, …, na quinta de S. Rosa para formação do hospital de coléricos”. Para o formar e manter a Câmara despende a quantia de 800 000 reis. Passado o período de maior crise epidémica parece que o interesse no hospital também passou.
No ano de 1885 é aberto um auspício na rua Direita pois a Câmara arrenda uma casa para o efeito, tendo pago um ano de renda adiantados.
A situação era de tal forma grave e preocupante que a Câmara informa a direcção dos Caminho-de-ferro que “no sítio do alto da Moita cujo terreno havia a mesma direcção arrendado para fazer ali um barracão por ordem do Ministério do Reino, a fim de nele isolar qualquer passageiro que por ventura fosse no trajecto atacado de doença suspeita. Informar que tal construção se não reatou”.
Já no século XX, 1903, é o Administrador do Concelho “que pede um quarto para instalar a subdelegação de saúde”.
Havendo necessidade de tratamentos ou internamento os médicos enviavam os doentes para o hospital de S. José, ou estes apresentavam-se pessoalmente. As despesas ficavam por conta da Câmara. As verbas gastas são regularmente referidas nos respectivos livros de contas da Câmara. Atingiam somas elevadas ficando a Câmara sempre devedora que ia pagando conforme podia. Várias vezes suspeita destas verbas, por vezes desconfia das pessoas que se apresentavam no hospital, sob o pretexto de não serem da Moita. Certo é que não havia controlo e a dívida ia sempre aumentando.
Farmácias
Num auto de Dezembro de 1908 é dito que na Moita existem três farmácias. Determinado que o “fornecimento de medicamentos a pobres e bolos para extinção de cães seja dividido pelas três”.


Vencimentos
Os vencimentos dos clínicos foram, como é natural, aumento ao longo dos tempos. Todavia a sua evolução foi lenta, estando quase um século sem alterações. Em 1667 o ordenado do médico no concelho de Alhos Vedros era de 60 000 reis e em 1685 era de 100 000 reis.
Já na moita mais de um século depois, em 1803, se mantinha em 60 000 reis acrescido de 60 reis por visita, não incluindo os pobres que tinha consultar de graça. Em 1807 passa para 140 000 reis podendo cobrar 120 reis por visita na vila e 300 reis no termo. Em 1810 passa para 300 000 reis como descrevi atrás.
No final do século estes preços mantêm-se.
Em 1877 o médico de Alhos Vedros recebe 300 000 reis anuais e pode cobrar as visitas, só a quem pague 1 000 reis de imposto, ao preço de 200 reis sendo na vila, 500 reis no campo e 120 reis se a consulta se realizar em sua casa, no ano seguinte aumenta para 150 reis. Aos pobres não cobrará nada e “não poderá negar-se sob pretexto algum, …, e a qualquer hora”. Passará as certidões de óbito gratuitamente. Fica proibido de se ausentar por mais de 24 horas.
As dificuldades em recrutar clínicos levam a Câmara a reconhecer os “deficientíssimos honorários do facultativo” e decide que as consultas no campo passem a custar 500 reis sendo dia e 1 000 reis sendo de noite.
Na Moita face às dificuldades em contratar médicos o vencimento passa para 350 000 reis, em 1884 aumenta para 400 000 reis e no ano seguinte para 500 000 reis, por ano.
O subdelegado de saúde aufere mais uma bonificação de 100 000 reis, anuais.
No caso de o médico acumular as duas freguesias, Alhos Vedros e Moita, acumula com o seu vencimento 200 000 reis. Não recebe dois vencimentos.
Para outro tipo de intervenção médica a Câmara definiu que “não havendo tabela de honorários por qualquer operação cirúrgica pequena ou grande” esta seja feita “de acordo com os pacientes fixando-se sempre com a máxima modicidade e em relação às forças de cada um”.