quinta-feira, 16 de maio de 2013

O diabo do Braga da Moita


O diabo do Braga da Moita

Manuel Luís Braga, o diabo do Braga da Moita, foi um liberal, pelo que se percebe nas entrelinhas do documento. Terá sido, (não posso confirmar) enforcado pelos absolutistas no reinado de D. Miguel.
Este personagem da história moitense apaixona só pelos documentos abaixo transcritos. É possível, até porque estes autos dão várias pistas de investigação, saber mais. Até lá… deixo aqui o que pude apurar, na esperança de que motive outros com mais disponibilidade, a investigar.


Auto de Vereação de 12 de Janeiro de 1805.
E na mesma, foi proposto pelo Procurador deste Concelho António de Sousa Freire que em vereação de vinte e dois de Dezembro do corrente ano próximo pretérito, se haviam eleito por esta Câmara para servirem de Almotaceis, nos meses de Janeiro, Fevereiro e Março do presente ano unanimemente consensoem (?) sairão eleitos Thomas António Soeiro e Valentim José Emmaus sujeitos hábeis, e capazes segundo a ordem desta Povoação, pois que têm bens, ofícios decentes, são naturais e moradores nesta vila, filhos e netos de vereadores, e do Procurador deste Concelho, e sabem ler e escrever, e não serem licenciados, por isso condignos do sobredito emprego para que foram eleitos, de cujos cargos se lhe não deu logo posse por obstar a falta de solenidade que está em prática de mostrarem suas folhas corridas ficando transferida esta ultimação para outro dia, sucedeu pois que um Luís da Silva Braga com orgulhoso despotismo só para nutrir as suas más intenções, da mavolencia (?) do seu génio por uma simples suspeita pediu vista da sobredita eleição, que sendo-lhe concedida pelo Meritíssimo Presidente que talvez lha não devera dar-lha pois que só pode pedi-la e agravarem das determinações da Câmara os vogais dela, por serem os membros que decidem as determinações da mesma, que em segredo se devem entender se propõem, facto este que só competiria pedir vista, e conceder-se-lhe depois de publicada, e executada a resolução, da vereação, assaz privilegiada pelas leis e pela razão, pois ao contrário, nunca se obteria completa execução, a que a Câmara determinasse, se antes de se executarem se dessem vista a quem delas pedisse contudo concedida a dita Vista fez em o dia sete do corrente citado o sobredito Braga, para vir com as razões dos seus embargos para os apresentar no termo de vinte e quatro horas ao que não satisfez suposto lhe fossem assinadas em audiência com pena de lançamento, e passado este termo sendo por equidade o dito embargante avisado pelo escrivão de nosso cargo para levar os autos, e formar os seus embargos os não levou o expoente Procurador desta Câmara e Concelho requereu na audiência do dia dez o lançamento dos ditos embargos, que sendo-lhe concedido pelo meritíssimo Juiz em termos pediu novamente o dito Braga outra vez vista para embargar o despacho já dado do lançamento, que lhe foi concedido em termos: Tendo em vista o expoente o relatado que só se encaminha a mover intriga, dolosa e culpável e aval acção, e orgulho alheia de toda a razão, e lisura maiormente sendo praticada por um homem que a todas as vistas não só maquina estas, e semelhantes desordens, como também não é pessoa legítima para embaraçar as determinações da Câmara antes de publicadas, e menos se achar habilitado para o fazer, pois que não tem concluído a contestação dos factos de seus convícios com que se opôs Manuel Ferreira Chaves interino vogal da Câmara e eleição, a que este assistiu quando o embargante teve votos para ser almotacé nos três meses próximo passado que deles se vê as vergonhosas exclusivas com que o sobredito vogal se opôs ao embargante por isso incapaz de ser admitido em o recurso, que agora intenta: E por que na época presente se precisa muito de haver juízes almotaces para a boa repartição das carnes ao povo para vigiarem sobre a distribuição dos mais géneros de primeira necessidade e examinarem a inteireza das aferições, punirem os transgressores das posturas em que tudo tem parte a Real terça e serviço de Sua Alteza Real exercícios que só aos almotaces competem na forma de seu regimento constante na ordenação do reino, e régias Provisões e Ordens. Por tudo o que fica dito lhe parecia ser de justiça e razão, fossem chamados os sobreditos eleitos, que mostrando os seus alvarás sem culpa se lhe desse e deferisse o juramento e posse para servirem de almotaces nos três meses mencionados, e que assim isto satisfeito o escrivão de nosso cargo dos sobreditos autos, que param em seu poder com mais documentos, que se julgassem convenientes, e deste justo procedimento se desse conta a Sua Alteza Real pela secretaria de Estado ou ao Régio Tribunal do Paço e assinou.

Auto de Vereação de 19 de Janeiro de 1805.
E logo pelo Procurador deste Concelho António de Sousa Freire foi dito e requerido, que Luís da Silva Braga morador nesta vila, continuamente de noite e de dia não cessa de mal dizer dos magistrados já do Meritíssimo Desembargador e Corregedor desta Comarca, animando-se a rogar a muitos que quem dizia aqueles convícios era o diabo do Braga da Moita, pois até o disse ao caminheiro Clemente José Correia quando veio com a ordem do mesmo Corregedor para serem levantadas as guaritas do contágio da peste, e que lho fosse dizer assim; e igualmente do nosso Meritíssimo Juiz Presidente desta Câmara, Almotaces e mais Justiças, palavras injuriosas lembradas só a quem tem um espírito revoltoso, maligno, e depravado, que até ofende, não só a quem dirige sua maledicência, mas ainda aos que o ouvem e isto sem escolha de lugar, pois que com toda a liberdade os publica, já nos barcos da carreira, nas praças, casas de pasto e bebida, em que frequentemente entra, até chega sua inimizade chamar e impor os títulos de ladrão a todos: E por que o ponderado se faz digno de Providencia requeria se lhe desse, segundo o caso exige castigo e quanto em atenção à sua pobreza e da sua família, se lhe não quisesse impor a de prisão, ou autuação ao menos a de assinar termo de não tornar a pronunciar tais palavras,……….., debaixo das penas de degredos para terras de África, e as mais penas impostas pelas leis contra os revoltosos, amotinadores e inquietadores do sossego e tranquilidade pública, a fim de ver se por este modo se coíbe sua maledicência , e reprime a depravação de sua má língua o que tudo é bem público nesta vila e aprovaria sendo preciso com pessoas de crédito e verdade que repetidas vezes, e em os ditos lugares o tem assim presenciado, e ouvido os pendurados factos e assinou António de Sousa Freire
O que sendo visto e ouvido pelos ditos vereadores determinarão se devera dar pronta execução ao que requeria o Procurador actual deste Concelho, pois que tinham em vistão a maledicência do sobredito Luís da Silva Braga, fosse o mesmo chamado na primeira conferência desta Câmara para a execução do dito requerimento.

Auto de Vereação de 23 de Janeiro de 1805.
E na mesma Câmara foi presente Luís da Silva Braga avisado por mim escrivão em observância do determinado a folhas, duzentas deste livro depois dele ser lido, a requerimento do Procurador actual deste Concelho de folhas cento e noventa e nove verso disse em sua defesa o seguinte: Que todo o conteúdo no dito requerimento passa pelo contrário, pois ele sempre respeitou, e respeita a todos os delegados do seu soberano, e igualmente a todos os concidadãos, como também as pessoas da mais baixa plebe, o que tudo se deixa ver, não só do seu procedimento e acções, como também na presente ocasião pelo comparecimento que fez, pois a passar na realidade o conteúdo do requerimento, que todo ele é falso, e afectado, deveria ele Procurador, ou outra pessoa que se sentisse agravada usar daquele meio que lhe permite a ordenação do livro primeiro, título sessenta e cinco parágrafo vinte e cinco, que pelo assim responder assinou
Luís da Silva Braga.

Auto de Vereação de 8 de Novembro de 1806.
E na mesma representou o Doutor Juiz de Fora desta vila António de Castro, Presidente desta Câmara, que as notórias e públicas violências, despotismos e usurpação de Jurisdição, praticados pelo almotacé Luís da Silva Braga, fazendo estes procedimentos arbitrários, e de prisão, contra os vassalos de Sua Alteza Real, e oficiais de justiça desta vila como praticou contra Francisco dos Santos Calado, Alcaide e Carcereiro desta mesma vila mandando-o recolher na cadeia desta vila fazendo-o descer para a enxovia pondo-o a tormentos, mandando-lhe deitar ferros, e mandando intimar, a sua ordem ao Tabelião do Judicial, Escrivão do Geral desta vila para que fosse à cadeia da mesma assistir às perguntas judiciais que o dito almotacé com o escrivão da almotaçaria fez ao preso Francisco dos Santos Calado, além destas coisas procedeu o dito almotacé a constranger aos estalajadeiros desta vila para que debaixo de pena de prisão, dessem quartel aos mendigos, como praticou com a estalajadeira Teresa Clara do Sacramento, além disso entrando em correcção  o dito almotace nas boticas desta vila procedendo a condenações, contra os boticários desta vila como praticou contra António da Rosa Martins e Castro, além de todos estes excessos, que de continuo praticou, já depois de ser corrigido e advertido em Câmara, não resultando desta correcção emenda alguma: foram estes os motivos e as razões que obrigaram ao dito ministro a dar a providencia interina de suspender ao dito almotacé Luís da Silva Braga para assim o coibir e abster de tantos excessos até a primeira vereação, em a qual o dito ministro expõe a esta Câmara para que ela haja de decidir livremente o que muito bem lhe parecer sobre este procedimento: E sendo ouvida por esta Câmara a representação supra decidiram que se convocasse as pessoas do povo para que fossem ouvidas sobre estes factos e se era ou não conveniente que o dito Luís da Silva Braga continuasse a exercer o dito cargo e todos uniformemente disseram que eram verdadeiros, e públicos todos os factos acima referidos e que de forma alguma convinham que o dito almotacé servisse o dito cargo pois que era um homem apaixonado, e tudo quanto praticava no exercício do dito cargo mostrava o amor e ódio para com as partes, pois favorecia umas, por amor, e castigava outras por ódio e vingança, de tudo isto mandou a Câmara que se lavrasse este termo e que todas as pessoas que presentes se achavam assinassem, e eu Manoel Luís de Mendonça Ribeiro o escrevi
Valentim José Emmaus                       Martinho José de Almeida
José da Silva                                       Pedro José dos Santos
Joaquim Carvalho                               José Rodrigues
Manoel Ferreira Chaves                      Francisco das Chagas e Silva
Manoel Victor de Almeida e Costa       Manoel da Costa
Manoel Rodrigues                                José Duarte
Simeão Rodrigues                                Pedro António de Barros
José Joaquim Soeiro                            José António Pereira Machado
José Carvalho de Oliveira                     Francisco José Correia
Francisco José Dias                              Francisco José Maria Livrero
Assinaram de cruz:
Luís de Abreu                                  Joaquim da Costa
José de Oliveira                               Thomas José Correia
António Carvalho de Oliveira            Cesário de Sena
Manoel Martins                                 António Lourenço
António de Pina                                Matias Cardoso
Manoel Nunes                                José Gonçalves
Sebastião José                               Manoel Cardoso
Valentim Gomes                              Manoel Pinto Ribeiro
Bernardino de Sena a rogo de Manoel Jorge

E sendo ouvidos por esta Câmara, e perguntadas as pessoas do Povo que a ela vieram acima assinadas, procederam a decisão do negócio exposto pelo doutor Juiz de Fora desta vila Presidente da Câmara pela maneira seguinte; Votou em primeiro lugar o Procurador actual do Concelho, que devia ficar suspenso do ofício de almotace Luís da Silva Braga. Votou em segundo lugar o vereador terceiro, que não dava o seu voto sobre o assunto proposto por que primeiro queria aconselhar-se.
Votou em terceiro o vereador segundo, que devia ficar suspenso o oficio de almotace Luís da Silva Braga: À vista da pluralidade de votos decidiu a Câmara que continuasse a ficar suspenso do oficio de almotace Luís da Silva Braga: E determinava mais a Câmara, que de todo este procedimento haviam dar conta a sua Alteza Real pela Mesa do Desembargo do Paço onde se decidiria como parecesse mais justo.