Escola Primária
Conde Ferreira da Moita
Desde o século XVIII que a Câmara da
Moita assumiu a responsabilidade pelo ensino primário, contratando Mestres de
Primeiras Letras, e disponibilizando instalações. Todavia durante mais de cem
anos o ensino primário passou por diversas vicissitudes, tanto no que se refere
a instalações como na nomeação de professores. Já depois de meados do século
XIX esta indefinição é notória, pois o professor régio da Moita, solicita à
Câmara que lhe seja paga a renda da casa onde dá aulas, na altura instalada na
Travessa da Madre de Deus. A Câmara decide pagar a renda em causa o que provoca
idêntico pedido desta vez da professora Maria Emília Guedes Mourão, da escola
de Alhos Vedros para que lhe fosse paga a renda da casa. Neste caso a Câmara
indeferiu o pedido, alegando que a professora em causa é proprietária da casa,
logo não tinha direito a receber renda.
É neste contexto que a Moita recebeu a
novidade de que iria ter uma escola, ou seja, um edifício construído
exclusivamente para esse efeito. Acontece que o benemérito Portuense doou à
Moita uma escola primária, como fez com dezenas de localidades.
Para um Concelho como a Moita um
edifício escolar era uma miragem, tanto mais que passava a ser o principal e
melhor edifício público da vila, pois nessa altura o Município não tinha sede
própria, a construção dos Paços do Concelho eram ainda só um sonho, não tinha
cadeia, pois era tão inadequada que os presos fugiam pelo telhado, e as
indispensáveis ou obrigatórias, como a construção do cemitério, eram adiadas
por sistemática penúria financeira da Câmara. O benemérito era o Conde de
Ferreira, falecido pouco anos antes sem herdeiros, deixou em testamento a sua
imensa fortuna para obras sociais, incluindo a construção de 320 escola por
todo o país. A Moita era uma das localidades contempladas com a verba de
1.200$000 reis, que seriam entregues à Câmara em quatro prestações
correspondentes a outras tantas fases de construção da escola, a saber: 1ª
quando a obra de pedreiro estivesse a meio, 2ª depois de coberto o edifício, 3ª
depois de acabado o trabalho de carpinteiro e trolha, 4ª depois de pintado,
vistoriado e aprovado.
A obra foi posta a concurso público e
arrematada a 26/6/1869 por 1.444$000.
O arrematante ficava sujeito a diversa
obrigações contratuais, como por exemplo, concluir a obra até 15 de Dezembro,
que foi cumprido, e depositar 90$000 reis, ou vinte libras como fiança, que lhe
seriam devolvidos no fim dos trabalhos.
No aspecto técnico da obra, o
arrematante tinha de sujeitar-se rigorosamente às plantas e executar a
construção com os materiais referidos na memória descritiva: a terra retirada
dos caboucos seria espalhada no terreiro da escola; os alicerces e paredes
seriam construídos com pedra macia de Porto Brandão e a argamassa empregue
seria colhida do leito do ribeiro que atravessa o juncal, contíguo ao
caminho-de-ferro, que dista uns cem metros da obra; os sobre arcos das portas e
janelas, assim como a cornija e o campanário seriam construídos em tijolos de
alvenaria; as ombreiras, peitoris, vergas das portas, janelas e chaminés, assim
como os degraus das entradas seriam de boa cantaria e sem molduras; toda a
canalização, incluindo os cotovelos, seria de canos de grez da fábrica da
Abrigada; as bacias e sifons das latrinas seriam de loiça; todas as juntas
seriam feita com cimento portland; o telhado seria amouriscado; o chão seria
lajeado e ladrilhado assentando sobre um beton composto por dez partes de
argamassa e oito de resíduos dos fornos da cal; as portas teriam bandeiras
envidraçadas; os corrimões e balaústres seriam de ferro; portas, janelas e
balaústres em madeira de casquinha; o alisares seria pintado de branco o tecto
e as abas de amarelo; a sala de aula teria quatro ventiladores de madeira
idênticos aos usados nas carruagens do caminho-de-ferro.
A cal necessária para a obra seria
fornecida pela Câmara, que arrendou o seu fornecimento a Vicente Maria Livério
por 1$400 reis cada moio, na condição deste fornecer à medida que fizesse falta
e de ser da melhor qualidade. Tinha ainda de desembarca-la no porto e fazê-la
conduzir para a obra à sua custa, e ainda um depósito de 10$000 reis como
fiança.
A construção da escola foi rápida,
antecedendo dois meses o prazo previsto. Logo em 29 de Junho a Câmara passa uma
procuração ao senhor João Batista de Lima, negociante do Porto, para levantar a
primeira prestação. Nos meses seguintes de Agosto, Setembro e Outubro a Câmara
manda receber as outras três prestações correspondentes às respectivas fases de
construção, afirmando na última que a obra estava concluída.
Durante a construção constatou-se que a
cozinha da casa do professor ficava completamente desprovida de luz. Para
eliminar esta deficiência a Câmara resolveu gastar mais 15$084 reis que o
orçado, numa pequena alteração de harmonia com a opinião dos técnicos, para
eliminar o defeito.
Incorporado no edifício escolar, ficava
a casa do professor, com sala, saleta, cozinha e latrina, tudo lajeado e
ladrilhado. Um verdadeiro luxo para a época, considerando que todas as casas da
Moita eram de sobrado ou simplesmente de terra batida. Além disso o professor
usufrui da habitação sem qualquer encargo. Refira-se que foi o professor
Gregório Gonçalves da Silveira, nomeado em Agosto de 1869, em substituição do
professor interino que era o capelão das almas. Padre Adriano Brito Pereira de
Resende, a estrear a nova casa e a escola.
A escola é inaugurada em 11 de Janeiro
de 1870, na presença das autoridades habituais e em clima de festa, que o
respectivo auto de vereação ilustra muito bem e que passo a transcrever, sem
alterações ao original, apenas actualizando a ortografia: … reunidos pelas 9 horas na sala dos Paços do Concelho toda a Câmara e
mais autoridades administrativas, judiciais e paroquiais e cidadãos previamente
convidados, e a professora de instrução primária com os seus alunos. A convite
do Presidente foram à Capela de S. Sebastião que serve de matriz devido às
obras na de Nª Sª da Boa Viagem, onde foi ouvido por todos com a maior
edificação missa por alma do benemérito. Daí foram ao edifício escolar, cujas
portas e janelas foram logo abertas pelo Senhor Presidente que entrou no
edifício à frente do préstito, convidou o professor a mandar os alunos tomar os
alunos tomar os seus lugares. Fez o discurso inaugural declarando aberta a
escola para todos os efeitos legais e entregou as chaves ao professor. Foi
então a inauguração anunciada ao público por algumas girândolas de foguetes, e
pelos hinos desempenhados pela Sociedade Filarmónica. Em seguida discursou o
secretário da Câmara, o professor e o reverendo pároco da freguesia de S.
Jorge, João José Libério da Costa. Seguiram depois para a sala dos Paços do
Concelho acompanhados pela Sociedade Filarmónica onde se lavrou esta acta. A
inauguração foi precedida pela bênção do edifício.
Notícias da Moita. 15 de Maio de 1996.
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