A estrutura municipal no antigo
regime.
A estrutura municipal no concelho da
Moita durante o antigo regime era a seguinte: um juiz de fora, nomeado pelo
rei, que acumulava com as funções de presidente da câmara, três vereadores e um
procurador, todos nomeados pelo rei, sob proposta das pessoas da governança
local, dois almutacés, um porteiro, um escrivão, um alcaide e dois
quadrilheiros, que eram oficiais nomeados pela câmara.
Outros funcionários também nomeados pela
câmara e referidos neste período eram o médico, o cirurgião, o professor, a
rodeira, as amas de leite e os caminheiros, mas não estavam ligados à
administração nem os seus vencimentos eram pagos pelo cofre do concelho mas
pelo cofre das sisas.
A administração do concelho competia ao
juiz de fora, vereadores e procurador. O juiz de fora era nomeado por três anos
e não voltava a ser nomeado no final do triénio para evitar que interesses e
simpatias pessoais pudessem interferir nas suas decisões. Era um homem de
formação universitária e sem raízes à terra. No caso de impedimento do juiz de
fora é o vereador mais velho que assume as suas funções, como juiz ordinário.
Os titulares destes cargos não podiam ter directamente nem por interposta
pessoa negócios com a câmara, para que as decisões não fossem influenciadas
pelos seus interesses.
Os vereadores e o procurador eram
nomeados anualmente. Escolhidos entre um leque muito restrito de pessoas da
terra, designadas como “homens da governança”, eram nomeados regularmente e de
forma rotativa, chegando alguns a contestar as nomeações por terem sido
preteridos nos anos em que, no seu entender, estava na sua vez de serem
vereadores.
O procurador tinha teoricamente a função
de defender os interesses do povo. Quando as eleições eram prejudiciais ao povo
de forma geral ou de alguma actividade em particular, competia ao procurador
apelar para a sua revogação. Os vereadores eram escolhidos quase sempre entre
os nobres e licenciados, enquanto o procurador era normalmente o alfaiate ou o
boticário.
Os vereadores eram responsáveis directos
pela acção administrativa do concelho e na sua área eram independentes. As
ordenações Filipinas neste particular determinam: “Aos vereadores pertence ter
carrego de todo o regimento da terra e das obras do concelho, e de tudo o que
pudessem entender e saber…” Eram um poder legislativo e jurídico de onde
dimanavam leis aplicadas nos limites geográficos do concelho. Competia-lhes
verificar as posturas, vereações e costumes antigos, caso estas não fossem
conforme as novas necessidades podiam revogá-los ou autorizá-los. Nestes casos
eram convocados todos os homens da governança ou em casos mais graves todos os
homens da nobreza e do povo com direito a voto.
As decisões dos vereadores não podiam
ser alteradas pelos oficiais do poder central, designados corregedores, que
pelo menos uma vez no ano faziam correcção pelo concelho para verificar a
aplicação das leis, mas deviam dar conhecimento ao rei das irregularidades pois
tinham uma função fiscalizadora.
Quando as decisões da câmara não eram
tomadas por unanimidade os vereadores vencidos podiam recorrer para tribunais
superiores mas as custas do processo corriam por conta dos próprios. Os
rendeiros de rendas públicas, assim como os respectivos pais e filhos, eram
excluídos de se candidatar a vereadores. Da mesma forma os familiares directos
dos vereadores não podem ocupar cargos na câmara nem ter com esta negócios, nem
concorrer a concursos públicos.
Os oficiais eram funcionários que faziam
cumprir as determinações da câmara, na Moita temos:
Almutacés a quem competia fiscalizar
a actividade económica. Assistiam à venda da carne, peixe, pão, vinho e de
todos os outros mantimentos de forma a garantir a sua distribuição equitativa e
o cumprimento das posturas. Verificam o estado das balanças, pesos e medidas e
o pagamento das rendas. Eram nomeados por trimestre, sendo quase sempre no
primeiro e segundo, os vereadores do ano transacto. Durante o século XVIII o
cargo despertou pouco interesse sendo constantes os avisos do tribunal do
desembargo do paço para que a câmara cumprisse com a obrigação de nomear
almutacés. No final do século devido a sérias dificuldades no abastecimento de
géneros o cargo adquire uma significativa importância. Nas últimas décadas do
Antigo regime apenas uma vez o nomeado pede escusa do cargo e devido a doença
que o impossibilitava de exercê-lo, o que é revelador do interesse pelo cargo.
A sua importância revela-se ainda quando a câmara ao fazer as nomeações, afirma
tratar-se das pessoas mais capazes e inteligentes. Certos autos relembram aos
almutacés a obrigação de cumprir os seus regimentos e nunca faltarem às suas
obrigações e deveres.
O porteiro era um cargo subalterno
que tinha como função apregoar as decisões da câmara. Assim competia ao
porteiro chamar as pessoas para as decisões de importância geral, como sejam a
arrematação das rendas, ou de casos particulares como avisar as pessoas
acusadas de alguma infracção a irem à câmara depor. Na Moita também exercia as
funções pontuais, como conduzir prisioneiros para a cadeia do Limoeiro em
Lisboa, o que era vulgar.
O lugar de escrivão era também um
cargo importante. Era normalmente exercido por nobres, alguns desses cavaleiros
eram professos da Ordem de Santiago. A sua importância devia-se, tanto aos
proventos que proporcionava, como por ser a pessoa que tinha conhecimentos para
esclarecer leis antigas e daí a sua capacidade para intervir em aspectos de
carácter económico e social.
O alcaide era o oficial de menor
relevo. Tinha por função conduzir presos e tomar conta da cadeia, acumulando
por isso as funções de carcereiro. Podia ocasionalmente exercer outras funções,
quando determinado pela câmara, como substituir o porteiro. Tinham no entanto
responsabilidades na execução das decisões, acompanhando os vereadores nas corridas
executam as decisões deste no seu aspecto policial, como prender pessoas. O
cargo não era fácil pois os alcaides foram-se sucedendo com regularidade ao
longo dos anos, alguns nem chegavam a aquecer o lugar, pois eram de imediato
suspensos por não executarem as ordens rapidamente e com zelo, enquanto os
cargos de porteiro e escrivão chegaram a ser ocupados pela mesma pessoa mais de
duas décadas.
Os quadrilheiros eram nomeados
anualmente pela câmara. Desempenhavam funções policiais e podiam encoimar e multar
sem necessidade de testemunhas. Zelavam para que as posturas fossem cumpridas e
intervinham na manutenção da ordem pública exercendo funções policiais.
Os louvados tinham a função de avaliar ou
reavaliar os bens que constavam em autos de arrolamento, de qualquer espécie.
Eram nomeados entre os oficiais nas matérias a avaliar, por isso designados
como peritos.
Os jurados são chamados para decidir
uma questão pendente em que a sua qualidade de especialistas nos assuntos a
decidir, garante uma decisão mais justa por ser a mais fundamentada. Ambos são
nomeados pontualmente para casos concretos.
A câmara nomeava ainda tesoureiros,
recebedores, fintores, escrivães e juízes das diversas rendas, foros e
vintenas, ofícios e de forma geral tudo quanto ao concelho e sua actividade
económica e social dizia respeito.
Nestas matérias a documentação local
é rica em situações caricatas, cómicas e mesmo anedóticas. Vejamos para
terminar apenas um exemplo. No ano de 1811 é nomeado para juiz e escrivão da
vintena do Rosário, José Tomé e Manuel Pereira, respectivamente. Como este
escrivão se ausentou entre Fevereiro e Junho, quando regressou verificou que
outro indivíduo de nome Tomás de Oliveira tinha sido nomeado para o seu lugar.
Não se contentando com a decisão o Manuel Pereira foi à câmara requerer a
anulação da nomeação do novo escrivão, argumentando que este, para além de ser
irmão do juiz e por isso impedido legalmente de ser escrivão, além disso não
sabia ler nem escrever.
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