domingo, 4 de março de 2012

A estrutura municipal no antigo regime.


A estrutura municipal no antigo regime.

        A estrutura municipal no concelho da Moita durante o antigo regime era a seguinte: um juiz de fora, nomeado pelo rei, que acumulava com as funções de presidente da câmara, três vereadores e um procurador, todos nomeados pelo rei, sob proposta das pessoas da governança local, dois almutacés, um porteiro, um escrivão, um alcaide e dois quadrilheiros, que eram oficiais nomeados pela câmara.
        Outros funcionários também nomeados pela câmara e referidos neste período eram o médico, o cirurgião, o professor, a rodeira, as amas de leite e os caminheiros, mas não estavam ligados à administração nem os seus vencimentos eram pagos pelo cofre do concelho mas pelo cofre das sisas.
        A administração do concelho competia ao juiz de fora, vereadores e procurador. O juiz de fora era nomeado por três anos e não voltava a ser nomeado no final do triénio para evitar que interesses e simpatias pessoais pudessem interferir nas suas decisões. Era um homem de formação universitária e sem raízes à terra. No caso de impedimento do juiz de fora é o vereador mais velho que assume as suas funções, como juiz ordinário. Os titulares destes cargos não podiam ter directamente nem por interposta pessoa negócios com a câmara, para que as decisões não fossem influenciadas pelos seus interesses.
        Os vereadores e o procurador eram nomeados anualmente. Escolhidos entre um leque muito restrito de pessoas da terra, designadas como “homens da governança”, eram nomeados regularmente e de forma rotativa, chegando alguns a contestar as nomeações por terem sido preteridos nos anos em que, no seu entender, estava na sua vez de serem vereadores.
        O procurador tinha teoricamente a função de defender os interesses do povo. Quando as eleições eram prejudiciais ao povo de forma geral ou de alguma actividade em particular, competia ao procurador apelar para a sua revogação. Os vereadores eram escolhidos quase sempre entre os nobres e licenciados, enquanto o procurador era normalmente o alfaiate ou o boticário.
        Os vereadores eram responsáveis directos pela acção administrativa do concelho e na sua área eram independentes. As ordenações Filipinas neste particular determinam: “Aos vereadores pertence ter carrego de todo o regimento da terra e das obras do concelho, e de tudo o que pudessem entender e saber…” Eram um poder legislativo e jurídico de onde dimanavam leis aplicadas nos limites geográficos do concelho. Competia-lhes verificar as posturas, vereações e costumes antigos, caso estas não fossem conforme as novas necessidades podiam revogá-los ou autorizá-los. Nestes casos eram convocados todos os homens da governança ou em casos mais graves todos os homens da nobreza e do povo com direito a voto.
        As decisões dos vereadores não podiam ser alteradas pelos oficiais do poder central, designados corregedores, que pelo menos uma vez no ano faziam correcção pelo concelho para verificar a aplicação das leis, mas deviam dar conhecimento ao rei das irregularidades pois tinham uma função fiscalizadora.
        Quando as decisões da câmara não eram tomadas por unanimidade os vereadores vencidos podiam recorrer para tribunais superiores mas as custas do processo corriam por conta dos próprios. Os rendeiros de rendas públicas, assim como os respectivos pais e filhos, eram excluídos de se candidatar a vereadores. Da mesma forma os familiares directos dos vereadores não podem ocupar cargos na câmara nem ter com esta negócios, nem concorrer a concursos públicos.
        Os oficiais eram funcionários que faziam cumprir as determinações da câmara, na Moita temos:
Almutacés a quem competia fiscalizar a actividade económica. Assistiam à venda da carne, peixe, pão, vinho e de todos os outros mantimentos de forma a garantir a sua distribuição equitativa e o cumprimento das posturas. Verificam o estado das balanças, pesos e medidas e o pagamento das rendas. Eram nomeados por trimestre, sendo quase sempre no primeiro e segundo, os vereadores do ano transacto. Durante o século XVIII o cargo despertou pouco interesse sendo constantes os avisos do tribunal do desembargo do paço para que a câmara cumprisse com a obrigação de nomear almutacés. No final do século devido a sérias dificuldades no abastecimento de géneros o cargo adquire uma significativa importância. Nas últimas décadas do Antigo regime apenas uma vez o nomeado pede escusa do cargo e devido a doença que o impossibilitava de exercê-lo, o que é revelador do interesse pelo cargo. A sua importância revela-se ainda quando a câmara ao fazer as nomeações, afirma tratar-se das pessoas mais capazes e inteligentes. Certos autos relembram aos almutacés a obrigação de cumprir os seus regimentos e nunca faltarem às suas obrigações e deveres.
O porteiro era um cargo subalterno que tinha como função apregoar as decisões da câmara. Assim competia ao porteiro chamar as pessoas para as decisões de importância geral, como sejam a arrematação das rendas, ou de casos particulares como avisar as pessoas acusadas de alguma infracção a irem à câmara depor. Na Moita também exercia as funções pontuais, como conduzir prisioneiros para a cadeia do Limoeiro em Lisboa, o que era vulgar.
O lugar de escrivão era também um cargo importante. Era normalmente exercido por nobres, alguns desses cavaleiros eram professos da Ordem de Santiago. A sua importância devia-se, tanto aos proventos que proporcionava, como por ser a pessoa que tinha conhecimentos para esclarecer leis antigas e daí a sua capacidade para intervir em aspectos de carácter económico e social.
O alcaide era o oficial de menor relevo. Tinha por função conduzir presos e tomar conta da cadeia, acumulando por isso as funções de carcereiro. Podia ocasionalmente exercer outras funções, quando determinado pela câmara, como substituir o porteiro. Tinham no entanto responsabilidades na execução das decisões, acompanhando os vereadores nas corridas executam as decisões deste no seu aspecto policial, como prender pessoas. O cargo não era fácil pois os alcaides foram-se sucedendo com regularidade ao longo dos anos, alguns nem chegavam a aquecer o lugar, pois eram de imediato suspensos por não executarem as ordens rapidamente e com zelo, enquanto os cargos de porteiro e escrivão chegaram a ser ocupados pela mesma pessoa mais de duas décadas.
Os quadrilheiros eram nomeados anualmente pela câmara. Desempenhavam funções policiais e podiam encoimar e multar sem necessidade de testemunhas. Zelavam para que as posturas fossem cumpridas e intervinham na manutenção da ordem pública exercendo funções policiais.
 Os louvados tinham a função de avaliar ou reavaliar os bens que constavam em autos de arrolamento, de qualquer espécie. Eram nomeados entre os oficiais nas matérias a avaliar, por isso designados como peritos.
Os jurados são chamados para decidir uma questão pendente em que a sua qualidade de especialistas nos assuntos a decidir, garante uma decisão mais justa por ser a mais fundamentada. Ambos são nomeados pontualmente para casos concretos.
A câmara nomeava ainda tesoureiros, recebedores, fintores, escrivães e juízes das diversas rendas, foros e vintenas, ofícios e de forma geral tudo quanto ao concelho e sua actividade económica e social dizia respeito.
Nestas matérias a documentação local é rica em situações caricatas, cómicas e mesmo anedóticas. Vejamos para terminar apenas um exemplo. No ano de 1811 é nomeado para juiz e escrivão da vintena do Rosário, José Tomé e Manuel Pereira, respectivamente. Como este escrivão se ausentou entre Fevereiro e Junho, quando regressou verificou que outro indivíduo de nome Tomás de Oliveira tinha sido nomeado para o seu lugar. Não se contentando com a decisão o Manuel Pereira foi à câmara requerer a anulação da nomeação do novo escrivão, argumentando que este, para além de ser irmão do juiz e por isso impedido legalmente de ser escrivão, além disso não sabia ler nem escrever.

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